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Viajar porque sim

Paixão por viagens, escrita e fotografia

Ter | 11.01.22

Para onde viajar em 2022?

 

Diz-me de que é que gostas, dir-te-ei para onde é que deves viajar. Este podia ser outro título para o post de hoje, porque é precisamente isso que vou tentar fazer: sugerir destinos (óbvios e menos óbvios) para cada tipo de viajante. Nada de muito complicado, porque em 2022 ainda vamos certamente encontrar algumas limitações às viagens; mas está na altura de começar a fazer planos, e de preferência vários – para haver sempre uma alternativa, caso o plano A não possa ser concretizado.

 

Para quem…

… é adepto de viajar devagar

 

Um destino óbvio → FLORENÇA

 

Tem tanto, mas mesmo tanto para ver, visitar e descobrir, que não é possível ir a Florença em modo “vou ali e já venho”. É uma cidade para ser explorada a pé e com alguma calma; e quando pensamos que já vimos tudo, eis que surge mais uma rua, um museu, uma igreja, um jardim para conhecer. No meu imaginário, Florença era compacta, pequena e aconchegante. Na realidade, revelou-se uma cidade arejada, cheia de piazzas amplas, de esplanadas, de espaços verdes com vistas desimpedidas. Depois, é preciso tempo para visitar os inúmeros museus, palácios e igrejas – e para estar nas filas extensas que antecedem a entrada nos locais mais emblemáticos. Há tanto para absorver que corremos o risco de uma overdose, se quisermos ver tudo com demasiada pressa. Porque o melhor de Florença são mesmo aqueles momentos que nunca vamos esquecer: saborear um gelado de caramelo salgado enquanto o sol se põe e cobre de ouro o rio Arno, descansar na esplanada de um café encontrado numa praça escondida da multidão, entrar numa loja antiga e aspirar o cheiro dos objectos de madeira que ali se vendem. As pequenas coisas que tornam uma viagem memorável não vêm nos guias.

 

 

Um destino menos óbvio → ANNECY

 

Situada na região de Haute-Savoie, muito perto da fronteira com a Suíça, Annecy é uma cidade pequena e sossegada à beira do lago com o mesmo nome. O centro histórico desenvolve-se à volta do rio Thiou e dos canais do Vassé, e a arquitectura preserva muitas das características típicas das regiões alpinas. Há flores por todo o lado, a comida é variada e apetitosa (mais ainda para quem for apreciador de queijo), e não faltam percursos para passear a pé, seja à volta do lago, no parque por onde passa o Thiou, ou nas ruas que acompanham os canais ou nos levam ao castelo. A uma mera dezena de quilómetros de distância, podemos visitar o Castelo de Montrottier, passear na magnífica floresta de Chavanod, ou percorrer o passadiço das Gargantas do Fier, 25 metros acima do nível do rio – e que foi construído em 1869!

 

Um passeio de barco no lago, com ou sem refeição a bordo, é obrigatório. O mesmo barco pode levar-nos a conhecer algumas das localidades e praias que existem nas margens do Annecy. E quando o tempo está bom, não faltam actividades náuticas à disposição dos visitantes.

 

No post Dias tranquilos em Annecy encontram mais pormenores sobre a minha estadia nesta cidade.

 

 

… quer fazer férias tranquilas numa ilha

 

Um destino óbvio → MENORCA

 

Menorca não tem defeitos. Enfim, lá terá alguns… e ser muito frequentada no Verão será decerto um deles. Mas as suas inúmeras virtudes mais do que compensam essas pequenas imperfeições. É uma ilha pequena, e portanto fácil de conhecer. Tem praias de sonho – e neste caso o termo não é exagerado – com uma temperatura da água fantástica, areia fininha, e na sua maioria inseridas numa paisagem ainda não demasiadamente humanizada. Tem cidades com um encanto especial, um aldeamento polémico (Binibequer Vell) que é uma atracção turística por si só, muitos povoados pré-históricos com características únicas, equipamentos culturais e uma variedade enorme de ofertas de alojamento e restauração. Tem tudo o que se pode querer para umas férias inesquecíveis.

 

Podem ler mais sobre esta ilha no post Menorca, finalmente.

 

 

Um destino menos óbvio → GOZO

 

Turisticamente, Gozo é uma espécie de “parente pobre” entre as três maiores ilhas de Malta. A maior parte dos visitantes do país dedicam-lhe apenas um dia, em que aproveitam para percorrer uma parte dos seus 67 km2 de carro ou visitar os locais mais famosos num autocarro turístico em modo hop-on hop-off. E no entanto, Gozo tem muito mais para oferecer a quem se dispuser a passar na ilha mais do que umas meras horas. Victoria, a cidade principal, é cheia de vida e de História, o centro geográfico e nevrálgico onde tudo conflui. Na costa sul encontramos as melhores falésias: para ver o pôr-do-sol, as de Ta' Ċenċ ou Sanap; para passear de barco ou fazer mergulho, as da baía de Dweijra, onde até há uns anos existiu a afamada Janela Azul, e onde a pequena lagoa conhecida como Mar Interior, rodeada de cabanas de pescadores, continua a atrair visitantes. Na costa norte estão as melhores praias de areia, como ir-Ramla ou San Blas, a localidade de veraneio Marsalforn, e as salinas artesanais de Xwejni, que se espalham ao longo de mais de um quilómetro num padrão de xadrez irregular e orgânico.

 

Há também monumentos imperdíveis, como a Basílica do Santuário da Virgem de Ta’ Pinu ou a de Xewkija, sede espiritual da Ordem de Malta, a Cidadela e a Basílica de São Jorge em Victoria, a impressionante igreja neogótica de Ghajnsielem, ou a Capela de Nossa Senhora de Lurdes, erguida num promontório debruçado sobre o porto de Mġarr e o ponto de referência que primeiro atrai a nossa atenção quando o barco que nos transporta se aproxima de Gozo.

 

E há, sobretudo, a facilidade de dias tranquilos que escorrem sem pressas, os passeios a pé ou de autocarro, quase sempre curtos, e as esplanadas onde nos demoramos ao pequeno-almoço, ao lusco-fusco ou depois de um bom jantar – com os sons da musical língua maltesa a embalarem-nos, e a tepidez da noite a prender-nos à cadeira, pedindo para ficarmos por ali só mais um bocadinho…

 

 

… é fã de museus

 

Um destino óbvio → LONDRES

 

A trepidante capital inglesa tem de tudo, e todos os tipos de viajante encontrarão nela motivos para voltar a visitá-la uma e outra vez. Mas uma das atracções culturais que mais me fascinam nesta cidade são os seus museus – e de tal modo que até já lhes dediquei um post em exclusivo: Museus de Londres. Não os conheço todos (tarefa difícil, já que são mais de 170…), mas conheço vários dos principais e todos eles são um regalo para os olhos e o espírito. O meu preferido, confesso, é o Victoria & Albert, e sempre que vou a Londres tenho obrigatoriamente de o visitar.

 

Dos mais clássicos aos mais invulgares, como o Museu dos Leques, o Museu de Freud ou o Museu das Marcas, os amantes de espaços expositivos têm de tudo um pouco para satisfazer a sua sede de conhecimento – ou simplesmente entreter o cérebro durante umas horas.

 

 

 

Um destino menos óbvio → ESTOCOLMO

 

Não é a primeira cidade que nos vem à ideia quando se pensa em cultura museológica, mas isso deve-se apenas ao desconhecimento. Estocolmo tem cerca de cinco dezenas de museus dos mais variados géneros, e alguns deles são verdadeiramente excepcionais. O mais peculiar deles todos é sem dúvida o Museu do Vasa, construído à volta de um navio de guerra que naufragou no século XVII na baía de Estocolmo e foi resgatado, quase intacto, nos anos 60 do século passado.

 

Outro lugar especial é o Skansen, um enorme parque-museu ao ar livre que funde etnografia, natureza e zoologia. Há vários museus dedicados à arte, outros sobre culturas orientais, o excelente Fotografizka (onde vi exposições de fotografia absolutamente espectaculares), o museu do Prémio Nobel, e até mesmo um exclusivamente sobre os Abba.

 

Há também os dois palácios reais, o de Estocolmo e o de Drottningholm – e aqui aconselho muito que façam as visitas guiadas, porque vão ficar a saber imenso sobre a História da Suécia e a visita terá todo um outro interesse. Num registo diferente, a própria rede de metropolitano é um enorme e magnífico museu, com muitas das suas estações concebidas como instalações de arte moderna, e absolutamente fora do vulgar. Uma visita a Estocolmo sacia a fome de qualquer amante de museus.

 

 

… gosta de caminhar na natureza

 

Um destino óbvio → YOSEMITE

 

Com 3.000 km2, quase 300 trilhos identificados de caminhada e várias zonas muito diferentes entre si para explorar, o Parque de Yosemite, no Estado da Califórnia, é sem dúvida uma das mais bonitas e bem preparadas regiões do mundo para viver e usufruir da natureza no seu estado praticamente selvagem.

 

Desde os passeios mais tranquilos ao longo do vale glacial, praticamente plano, até às subidas à famosa Half Dome, há caminhadas para todos os gostos. Numerosas cascatas, formações graníticas incríveis, sequóias gigantes, lagos, muita vida selvagem (os avisos para não deixar comida onde os ursos lhe possam chegar estão por todo o lado) e até praias fluviais. E não nos podemos esquecer de aproveitar as fantásticas vistas do céu nocturno.

 

O vale central está povoado de lugares onde ficar: tendas de lona, cabines de madeira, estacionamento para autocaravanas, albergues, bed & breakfasts e hotéis de luxo, todos com óptimas condições para servir de base aos passeios. Daqui partem vários trilhos ao longo do vale, e também as estradas que ligam aos pontos de interesse mais distantes, tudo extremamente bem mapeado para ter a certeza de que encontramos aquilo de que viemos à procura. E para ajudar a isso, há imensas actividades (alpinismo, canoagem, pesca...) e workshops para todas as idades, para podermos ficar a conhecer melhor a natureza deste parque.

 

Só mais uma nota: apesar do parque de Yosemite ser grande e diverso o suficiente para que se possa passar lá uma boa temporada, esta zona dos Estados Unidos está povoada de parques naturais. A entrada em Yosemite custa 35$, mas por 80$ é possível comprar o passe anual America the Beautiful e ficar a conhecer outros lugares incríveis à distância de um ou dois dias de carro, como Death Valley, Zion, Grand Canyon, Arches, Monument Valley ou Joshua Tree, entre muitos, muitos outros.

 

 

Um destino menos óbvio → FRAGAS DO EUME

 

O Parque Natural das Fragas do Eume é uma maravilha da natureza que fica na Galiza, não muito longe de A Coruña. Com mais de nove mil hectares e praticamente desabitado, tem uma das florestas ribeirinhas melhor conservadas e mais virgens da Europa. São vários os trilhos que é possível percorrer neste parque, e cada um desvenda paisagens diferentes, todas elas extraordinárias. O mais frequentado acompanha uma parte do curso do rio Eume e leva-nos até ao Mosteiro de San Xoán de Caaveiro, de onde depois descemos até ao rio Sesín, numa sucessão de cenários que parecem saídos de filmes com temática medieval e misteriosa. Neste bosque fabuloso, em que o sol nem sempre tem permissão para entrar, há árvores estranhas, musgos e líquenes, ribeiros e cascatas, antigos moinhos de pedra, e muita magia no ar – quando terminamos o passeio, a cabeça está mais leve e temos toda uma outra energia.

 

Falo dele e de outros lugares desta belíssima região da Galiza no post Na Galiza, entre mosteiros e fervenzas.

 

 

… gosta de andar de bicicleta

 

Um destino óbvio → AMESTERDÃO

 

Há muitas razões para Amsterdão ter um carácter tão único, e a omnipresença da bicicleta é talvez a maior de todas elas. Um pouco por toda a Holanda, mas mais ainda na capital, a bicicleta é o meio de transporte principal e muito da cidade está pensado para ela. As ruas mais movimentadas do centro têm todas ciclovias, semáforos dedicados, e estacionamentos enormes nos locais mais importantes.

 

Sendo totalmente plana, atravessar a cidade inteira de bicicleta é um projecto de viagem facilmente alcançável, oferecendo a versatilidade de se ir parando onde e quando se quiser, quer seja acompanhando os canais, quer atravessando bairros que parecem desenhados a régua e esquadro, onde os edifícios de poucos andares são forrados de tijolo e as janelas têm tamanhos XXL. É também muito útil para ir até outro transporte para viagens mais longas, deixando-a estacionada à porta de qualquer estação e levando-a de novo de volta a casa. Em todo o lado se consegue alugar uma bicicleta por algumas horas ou alguns dias, e muitos hotéis disponibilizam bicicletas próprias aos seus hóspedes.

 

Fica um único aviso: andar de bicicleta no centro de Amsterdão não é para qualquer um. Os locais estão mais do que habituados a usarem-nas e andam a velocidades que impressionam quem vem de fora, as ciclovias não são muito largas para a quantidade de bicicletas que se vêem nas artérias principais e, como se isso não bastasse, são partilhadas com os ciclomotores (algo que os habitantes estão há alguns anos a tentar mudar). Escolher a bicicleta para andar por estas ruas é, ainda assim, um desafio muito recompensador.

 

 

Um destino menos óbvio → BOLONHA

 

Se leram o post Duas semanas em Itália já sabem que Bolonha foi uma das melhores surpresas que tive na minha mais recente viagem a este país. A cidade das torres e das arcadas – e dos estudantes! – tem muitos e deliciosos segredos para descobrir, e tem uma vibe jovem e descontraída. Além do mais, é substancialmente plana, o que faz dela ideal para percorrer de bicicleta. O centro tem algumas ruas vedadas ao trânsito automóvel, e a bicicleta é um meio de locomoção versátil que chega a todo o lado, é fácil de estacionar, não polui e ajuda a manter a forma. É fácil organizar itinerários para ver as arcadas mais emblemáticas e as torres medievais que sobreviveram até aos nossos dias, ou simplesmente vaguear pela cidade universitária. Existe uma ciclovia – a Tangenziale delle Biciclette – que liga todas as portas de Bolonha, rodeando o centro histórico. E nas franjas da cidade há parques e amplos espaços verdes por onde é possível pedalar quando surge a vontade de fugir ao bulício. Visitar Bolonha de bicicleta permite parar quando e onde se quer, e cobrir distâncias maiores sem ter de apanhar um transporte público ou andar demasiado a pé. É sem dúvida uma cidade altamente aconselhável para os fãs das duas rodas com pedais.

 

 

… tem vontade de fazer um cruzeiro fluvial

 

Um destino óbvio → RIO NILO

 

Quem não sonha com um cruzeiro no Nilo? Deslizar pelo rio a bordo de uma embarcação que mal trepida, vendo as margens cultivadas passar pela janela panorâmica do quarto e as silhuetas bicolor dos íbis em voo contra o céu azul intenso, que nem uma nuvem perturba. Ao cair da tarde, visitar templos que contam histórias com milhares de anos, e sentirmo-nos pequeninos ao pé de colunas grossas como colossos e altas como arranha-céus, cobertas de hieróglifos misteriosos que evocam uma cultura tão peculiar que mais parece alienígena. Acordar de madrugada e entrar num autocarro, almofada debaixo do braço, que nos embala no sono até chegarmos a Abu Simbel, onde foram reconstruídos os gigantescos templos salvos das águas da Barragem de Assuão.

 

Descer um troço do Nilo em modo cruzeiro é uma experiência relaxante, exótica, culturalmente interessante… e – não tenhamos ilusões! – muito turística. Pode haver maneiras melhores de conhecer o Egipto, e haverá momentos que não se assemelham em nada ao que imaginámos, mas a nossa memória selectiva encarregar-se-á de os apagar.

 

 

Um destino menos óbvio → CANAL DU MIDI

 

Une o Oceano Atlântico ao Mar Mediterrâneo, atravessando a região da Occitânia, e é Património Mundial da UNESCO desde 1996. Esta rede de canais com 360 km concebida por Pierre-Paul Riquet é um feito notável da engenharia do século XVII. Está dividida em cinco secções e inclui 328 estruturas diversas: aquedutos, pontes, túneis e eclusas. Apesar da mestria técnica que foi necessária para o construir e sobretudo para conseguir que fosse continuamente alimentado sem correr o risco de secar, o Canal du Midi está tão harmoniosamente inserido na paisagem que o tomamos por um curso de água natural – e o engano é perfeitamente justificável.

 

A cereja no topo do bolo é que o Canal du Midi é facilmente navegável na sua maior parte, e passa por locais idilicamente bucólicos e por aldeias e vilas que correspondem em tudo à França do nosso imaginário. Um cruzeiro neste Canal pode ser feito autonomamente, alugando uma embarcação pelo tempo pretendido e com ou sem capitão, parando quando e onde se quer; ou em cruzeiro organizado, com todo o conforto e sem termos de nos preocupar com nada. A oferta é muito variada e há vários percursos e durações de viagem possíveis, com paragens nos lugares mais emblemáticos para visitar pontos de interesse, mas uma coisa é certa: será uma viagem inesquecível.

 

As minhas impressões sobre esta região, que visitei há poucos anos, estão no post Um cheirinho a sul de França - I - Carcassonne e o Canal du Midi.

 

 

… é apreciador de ouro

 

Um destino óbvio → SÃO PETERSBURGO

 

Se há cidade que ostenta sem vergonhas a sua opulência, São Petersburgo é com certeza uma das mais exibicionistas. Ao ar livre, para onde quer que olhemos, há ouro a brilhar ao sol – ou mesmo que não haja sol nenhum. Pode ser a cúpula da Catedral de Santo Isaac, uma torre da Fortaleza de Pedro e Paulo, as asas dos leões alados da Ponte do Banco, um dos bolbos da exótica Catedral do Sangue Derramado, ou um pormenor do Palácio de Inverno.

 

No interior dos monumentos, a quantidade de ouro é por vezes tanta que fere a vista, e é preciso resistir à vontade de pôr os óculos de sol. Difícil é também não andar permanentemente de boca aberta enquanto visitamos as salas principais do Hermitage no Palácio de Inverno, deparamos com a deslumbrante iconóstase da Catedral de São Pedro e São Paulo, uma obra de arte primorosamente trabalhada e completamente recoberta de ouro, ou observamos os objectos expostos no Museu Fabergé, em que o dourado compete com o brilho das pedras preciosas e de outros metais.

 

Tanta opulência torna difícil recordar que a cidade já atravessou muitos momentos negros ao longo dos seus poucos séculos de existência. Capturada aos suecos em 1703 pelo czar Pedro I, o Grande, construída sobre terrenos pantanosos por camponeses e prisioneiros escravizados, com um custo de dezenas de milhares de mortos, foi palco de enormes incêndios, do detonar da Revolução de Outubro, e de um cerco de 872 dias durante a Segunda Guerra Mundial que se saldou num milhão de mortos – o cerco mais extenso e destrutivo de toda a história dos últimos séculos. O esplendor de São Petersburgo ofusca até mesmo os visitantes mais avisados, mas é uma cortina de fumo que disfarça os segredos obscuros do passado da cidade.

 

 

Um destino menos óbvio → ISTAMBUL

 

Dona de uma das linhas de horizonte citadinas mais fascinantes do mundo, metrópole gigantesca dividida entre o oriente e o ocidente, entre o passado e o futuro, entre a modernidade e a tradição, Istambul lançou sobre mim um feitiço há muitos anos (leiam o post O coração de Istambul (e Istambul no meu coração) para saberem mais pormenores), e mesmo depois de conhecer bastante mais mundo continua a ser a minha cidade europeia preferida.

 

Dominada pelo cinzento e branco do exterior das mesquitas e palácios, e pelo aspecto anódino da maioria dos outros edifícios, é dentro de portas que a cidade desvenda a sua riqueza. Acercamo-nos do Topkapi e parece-nos mais uma fortaleza do que um palácio, construção sem aparentes requintes exteriores, nada que o torne particularmente atraente. Mas depois entramos em salas cheias de tesouros, vemos tronos em ouro cravejados de gemas preciosas, adagas, capacetes, berços, torneiras e gradeamentos feitos do mesmo metal; e há paredes e tectos onde o dourado domina, roupas bordadas a fio de ouro, objectos do dia-a-dia revestidos de plaqué (ou será que são de metal maciço?). Em Santa Sofia, brilha o dourado dos frescos restaurados, do mirhab e do minbar; na Mesquita de Solimão, o ouro das decorações refulge iluminado pelos grandes candeeiros circulares; o interior do Palácio de Dolmabahçe é uma orgia de carpetes e tapeçarias, madeiras nobres, damascos e estofos aveludados, vidros, espelhos e lustres cintilantes, inseridos em divisões gigantescas em que o dourado é tanto que até encandeia. E nas joalharias do Grande Bazar há uma tal quantidade de ouro que ficamos com a cabeça a andar à roda (e a duvidar de que tudo aquilo seja mesmo verdadeiro…).

 

Não terá sido à toa que deram a uma área de Istambul o nome de Corno de Ouro.

 

 

… adora vida nocturna

 

Um destino óbvio → LAS VEGAS

 

A maior parte dos locais de turismo virado para a vida nocturna oferecem discotecas enormes com os maiores DJs do mundo, festas vibrantes apinhadas de gente que se quer divertir à noite e descansar numa praia com uma boa bebida na mão durante o dia. Las Vegas oferece muito mais do que isso.

 

Las Vegas é um cliché dos filmes americanos quando falamos de festas de arromba, e não é por acaso. Numa cidade onde todos as casas – hotéis e casinos, discotecas, restaurantes e salas de espectáculo – disputam entre si a atenção dos visitantes, a qualidade e quantidade do entretenimento cresce de forma exponencial. Para aproveitar a vida nocturna, além das centenas de discotecas que povoam a cidade (e sobretudo a Strip), há espectáculos de renome em cena todos os dias, restaurantes óptimos com entretenimento e, claro, o rebuliço dos casinos.

 

Mas a expressão "vida nocturna" nem está completamente certa quando falamos de Las Vegas. Nesta cidade, a festa é constante. Pelas primeiras horas da manhã, quando as discotecas começam a fechar, abrem as casas de After Hours (também esta uma denominação errada, porque costumam estar abertas desde madrugada até ao final da noite). Depois disso, os hotéis e casinos fazem questão de manter os hóspedes entretidos com as famosas festas nas piscinas e espectáculos e actividades a várias horas do dia. Aliás, se estivermos dentro de um hotel-casino o dia todo (e garanto que há razões para o fazer) será muito difícil dizer que horas são.

 

E como se isso não bastasse, Las Vegas alberga inúmeros festivais ou convenções que ali vão todos os anos, e que representam uma grande fatia da indústria turística da cidade. Se visitar a cidade quando estiver um destes festivais a decorrer (e é muito provável que aconteça) e ainda lhe restar energia, porque não fazer uma visita?

 

 

Um destino menos óbvio → BUDAPESTE

 

O charme de Budapeste deve-se em muito à sua aura de decadência, que a cidade sabe capitalizar com mestria. Martirizada de várias formas durante praticamente todo o século XX, em vez de esconder as suas cicatrizes opta por as exibir orgulhosamente. Enquanto Buda, na margem oeste do Danúbio, mostra uma estética vintage algo sofisticada – é aqui que encontramos o funicular que inspirou Wes Anderson para o seu filme The Grand Budapest Hotel e as famosas Termas de Géllert, só para citar dois exemplos – em Pest o ambiente é claramente mais hipster: fachadas decrépitas e grafitadas, com portas e elevadores velhos, escondem apartamentos modernizados, muitos deles destinados a alojar turistas ou jovens estudantes; o fabuloso edifício do Grande Mercado Central viu o seu interior transformado em espaço higienizado, algures entre o popular, o gourmet e o turístico; multiplicam-se os trabalhos de street art nas paredes dos prédios; e a lendária Linha 1 do metro (que é a segunda linha férrea subterrânea electrificada mais antiga da Europa e se mantém em funcionamento há mais de 120 anos), pouco mudou de aspecto desde os seus primórdios.

 

Durante o dia, as ruas do Distrito VII de Pest estão relativamente sossegadas, com umas quantas lojas abertas e o movimento normal de transeuntes. Mas ao cair da noite, o ambiente muda – é aqui que estão situados grande parte dos restaurantes, bares e discotecas mais concorridos da capital húngara, a par com lojas de roupa e objectos em segunda mão ou que primam pelo design, ateliers de tatuagem ou cabeleireiros, numa miscelânea que é tão apelativa para as faixas etárias mais jovens como para os turistas de todas as idades. A noite pode começar num restaurante de comida israelita, húngara ou vegetariana, ou numa barraquinha de street food do Karaván, continuar com uma bebida no amplo pátio que dá pelo nome de Mazel Tov ou num dos bares que encontramos porta sim, porta sim, e terminar (ou não!) num karaoke na Gozsdy Passage, ou no Szimpla Kert, o ruin pub mais famoso de Budapeste, que ocupa o edifício de uma antiga fábrica e é uma amálgama de objectos kitsch ou reutilizados, plantas, cores, música, projecções, salas, escadas, mesas e bancos, muito barulho e gente em constante movimento (ou então no Instant, no Fogas Ház, no Ötkert… há muito por onde escolher).

 

Para uma noite diferente mas igualmente divertida, as Sparty (aos sábados à noite) nas Termas de Szechenyi são uma boa alternativa. E se tivermos vontade de uma noite mais tranquila, ou mais romântica, a opção certa é fazer um jantar-cruzeiro no Danúbio, ou simplesmente atravessar a Ponte das Correntes, com vista para a cidade iluminada em ambas as margens do rio. A noite, em Budapeste, é tudo menos monótona.

 

 

Nota: Este post teve a colaboração preciosa do Alexandre Álvaro, viajante por gosto e por profissão, a quem muito agradeço.

 

 

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