Diário de uma viagem à Costa Rica XII
Dia 12
Depois de uma noite mal dormida em que fomos continuamente atacados por uma horda de mosquitos, por volta das seis e meia da manhã saímos para ir explorar Montezuma. Antes de entrarmos na localidade fizemos um desvio para tentar encontrar o caminho para as cascatas. A dada altura, uma manchinha vermelha numa árvore à beira da estrada chamou a nossa atenção: sem nos ligar qualquer importância, um pica-pau de banda branca martelava afanosamente um tronco de árvore, sem dúvida à procura de comida, corpo negro com riscas laterais brancas partindo do bico e uma divertida crista de penas berrantemente encarnadas na cabeça.
Em Montezuma, como não podia deixar de ser, a primeira paragem foi para tomarmos o pequeno-almoço no Sano Banano, mesmo no coração da localidade. Bem instalados numa mesa ao ar livre, debaixo de um alpendre, bebemos sumos e comemos panquecas e tostas até estarmos cheios, observando a variedade de pessoas que iam desfilando na rua em frente. Empoleirado num poste de madeira a ver se lhe calhava alguma comida em sorte, um enorme gaio-rabudo branco e azul vigiava a esplanada, a sua poupinha característica vibrando de cada vez que virava a cabeça.
Desde os anos 80 que Montezuma tem vindo a ganhar popularidade como destino para viajantes de todo o mundo, muitos dos quais se têm instalado por aqui, atraídos pelo estilo de vida liberal, descontraído e sobretudo económico da região. A comunidade inclui pessoas de todos os tipos e idades, muitos deles artistas plásticos, músicos ou cozinheiros, e respira-se uma atmosfera indolente e meio hippie.
Depois do pequeno-almoço, partimos em busca de postais. Montezuma tem uma dezena de ruas de terra batida, ladeadas de casas maioritariamente em madeira e pintadas de várias cores. Os letreiros comerciais que anunciam as inúmeras lojas e locais de alojamento um pouco por todo o lado são pintados à mão e ostentam tonalidades vivas e desenhos estilizados ou naif, com folhas, flores e animais. A igreja situa-se no meio de um belíssimo jardim rodeado por um muro rosa e azul, e é toda feita em ripas de madeira de cor escura com um telhado também em madeira, mas pintado de verde. A entrada faz-se por baixo de quatro pilares de cimento que suportam uma torre em formato de paralelepípedo quadrangular, com cruzes embutidas em madeira mais escura nas faces e um telhado em pirâmide no mesmo tom de verde, com um beiral largo.
Junto ao mar alternam-se zonas rochosas e praias de areia clara. A mais bonita de todas é sem dúvida a Playa Las Manchas, na saída oeste de Montezuma em direcção a Cabuya, onde a água é quase branca de tão transparente. Sobre as rochas que despontam do mar, um grupo de pelicanos castanhos descansava, sacudindo as asas e penteando as penas.
O rio Montezuma pouco mais é que um ribeiro, mas as suas cascatas são um dos locais a não perder na região. Só são acessíveis a pé, pelo que deixámos o carro estacionado junto à estrada principal, pegámos nas toalhas e iniciámos o passeio. Por carreiros já abertos por muitos pés, saltando por cima de raízes e de enormes pedras amontoadas nas margens e dentro do rio, lá fomos subindo vagarosamente, observados aqui e ali por garças-tigrinas que não pareciam nada incomodadas com a presença de seres humanos nas proximidades. Ainda não eram nove da manhã, e por isso foram raras as pessoas que encontrámos no caminho. Ao fim de vinte minutos, o rio e as árvores abriram-se para nos recompensarem com a visão belíssima de um pequeno lago rodeado de rocha, do alto da qual caía suavemente uma cascata espumosa.
Apesar de ser cedo já estava muito calor, e não tardámos a entrar na água quase gelada. As margens e o fundo estavam cobertos de grandes pedras lodosas e viam-se peixes de um lado para o outro. O local estava tranquilo e apenas se ouvia o barulho da água a cair, que mesmo assim não incomodava. A pouco e pouco foram chegando mais pessoas que se espalharam sobre as rochas da margem, também em busca de um pouco de frescura.
Ficámos por ali mais de uma hora, e teríamos certamente ficado mais tempo se não tivéssemos já programado chegar a Manuel Antonio ainda nesse dia – um percurso de 200 km que incluía uma deslocação em ferry-boat. Assim, regressámos ao Ancla de Oro, arrumámos as malas e partimos para leste.
Paquera fica a 50 km de Montezuma e a estrada é bastante razoável, por isso cumprimos o percurso em cerca de uma hora. Por azar, quando chegámos tinha acabado de sair um ferry, e o próximo só partia às 3 da tarde, quase hora e meia depois. Deixámos o carro na fila e aproveitámos o tempo de espera para almoçar na soda da própria estação.
A viagem entre Paquera e Puntarenas demorou uma hora e um quarto, mais o tempo para retirar o carro do ferry. O porto de Puntarenas fica no extremo de uma língua de terra estreita com 5 km de comprimento, por onde corre uma única estrada asfaltada. A sul, mar aberto e praia; a norte, um grande estuário, mais abrigado e com a costa do outro lado à vista, funcionando como um extenso porto. Puntarenas foi até ao séc. XIX o principal porto de embarque do café cultivado nas terras altas, mas hoje vive sobretudo da pesca. A cidade em si pareceu-nos algo desprovida de interesse, com casinhas baixas e rodeadas de gradeamentos ao longo da estrada. A tarde avançava a olhos vistos, e por isso seguimos caminho sem parar.
Surpreendentemente, a estrada asfaltada continuou e de repente parecia que estávamos numa qualquer região europeia, com grandes placas sinalizadoras, nós de ligação e viadutos, e a possibilidade de acelerar para mais do que 60 quilómetros por hora.
Fizemos uma breve paragem em Jacó, uma das estâncias de veraneio mais conhecidas e frequentadas do país, também famosa por ser um bom local para o surf. A praia é extensa (3 km) e larga – embora a areia cinzenta e a água turva não sejam particularmente atraentes – e muitos ticos tinham estacionado os seus carros entre as palmeiras e aproveitavam para desfrutar do pôr-do-sol. Uma ampla marginal acompanha a praia, onde infelizmente já rompem algumas construções em altura e se anunciam muitas mais, sinal de que por ali as coisas já começaram a mudar – e não para melhor, na minha opinião.
Depois foram mais 80 km sob a noite escura até Manuel Antonio. Uns quilómetros antes passámos Quepos, uma rede de ruas rectilíneas cheias de pessoas, carros, casas e néons brilhando no escuro. Finalmente, pelas 7 e um quarto entrámos em Manuel Antonio. Servindo essencialmente de apoio aos milhares de turistas que visitam anualmente o Parque Nacional que tem o mesmo nome, a localidade estende-se ao longo de uma rua principal algo íngreme que serpenteia por entre a vegetação e termina numa rotunda à entrada do Parque. De ambos os lados, inúmeros hotéis e restaurantes rodeados de jardins e arvoredo. Depois de alguma pesquisa, escolhemos o Hotel Verde Mar para nos alojarmos. Com uma entrada completamente aberta para o exterior (característica comum à maioria dos estabelecimentos hoteleiros e de restauração de Manuel Antonio), é um edifício com dois pisos pintados de amarelo e coral, com telhado irregular branco, portas e balaustradas em madeira trabalhada e ornamentos em pedra. Amplo e bem decorado, embora sem ter um aspecto luxuoso, está situado no meio de um extenso jardim tropical habitado por macacos-capuchinho, onde um passadiço de madeira faz a ligação directa com a praia de Espadilla norte, depois de passarmos junto à pequena piscina.
A porta do nosso quarto, o 302, mostrava uma enorme iguana em alto-relevo. Lá dentro, paredes amarelas com um friso de bicharocos pintados junto ao tecto, chão de mosaico e mobiliário em ferro forjado criavam uma atmosfera fresca – para a qual o ar condicionado e uma ventoinha também davam a sua importante contribuição. Um varão branco com cabides de madeira fazia as vezes de roupeiro, e a casa de banho era suficientemente ampla e agradável, decorada em tons de azul e verde. Um verdadeiro quarto de hotel de praia, alegre, fresco e confortável.
Refrescámo-nos e depois saímos para jantar no La Cantina, o restaurante que nos foi aconselhado pela recepcionista. Em Manuel Antonio, os restaurantes competem uns com os outros em tamanho e excentricidade, e vêem-se as decorações mais invulgares que é possível imaginar – incluindo aviões. O La Cantina é um restaurante especializado em grelhados e cozinha local, onde uma das salas é uma carruagem de comboio antiga pintada em tons de verde e creme, e por isso é impossível passar despercebido. A madeira impera e a iluminação é reduzida, proporcionada apenas por grandes candeeiros de ferro forjado que pendem do tecto, apliques com luz fraca e velas nas mesas. Há música ao vivo, o ambiente é muito agradável e a comida absolutamente deliciosa. Um final perfeito para um dia cansativo mas muito bem passado.
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