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Viajar porque sim

Paixão por viagens, escrita e fotografia

Ter | 13.07.21

O mundo de Serralves

 

No Porto, existe uma palavra única, simples, que encerra um mundo de possibilidades: Serralves. É mais popular entre os locais do que entre os visitantes, talvez por já ficar afastado do coração da cidade, ou talvez pela sua aura de lugar de cultura, quiçá de elitismo. Ninguém – ou quase ninguém – vai ao Porto de propósito para ir a Serralves. Mas deviam.

 

Serralves é um daqueles lugares intemporais onde a natureza, a arte e a história se encontram e integram em harmonia. É uma casa, que tem um parque, que tem jardins, que têm um museu. É um local onde podemos ver uma exposição, almoçar, descansar, passear entre as copas das árvores, namorar, levar as crianças, passar umas horas ou um dia inteiro. É um lugar para saborear, para olhar, para cheirar – um lugar que desperta os sentidos e nos satisfaz, qualquer que seja o humor do dia.

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O PARQUE

 

A história de Serralves começa em 1923, quando o 2º Conde de Vizela, Carlos Alberto Cabral, herdou a Quinta do Lordelo, uma propriedade de veraneio da sua família situada no que eram nessa altura os arredores do Porto. Até aos anos 40, a área da quinta foi sendo aumentada através da compra de terrenos vizinhos, incluindo a Quinta do Mata-Sete. Em 1932, por encomenda do Conde de Vizela, o arquitecto francês Jacques Gréber concebeu um novo projecto paisagístico para os jardins da propriedade, inspirando-se nos jardins franceses clássicos e integrando alguns elementos que já existiam.

 

Em inícios dos anos 50, Serralves foi vendida a Delfim Ferreira, Conde de Riba d’Ave, e em 1986 foi finalmente adquirida pelo Estado português, que a abriu ao público em Maio do ano seguinte. A qualidade intrínseca do Parque e o cuidado posto na sua conservação valeram-lhe em 1997 o galardão “Henry Ford Prize for the Preservation of the Environment”.

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O Parque tem um património florestal impressionante, que inclui milhares de exemplares de árvores e arbustos de 230 espécies e variedades diferentes, algumas delas já raras. Os 18 hectares que constituem actualmente a propriedade são também o habitat de uma enorme diversidade de animais, entre aves, anfíbios, répteis, morcegos e insectos.

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Dividido em várias zonas distintas, Serralves é tão grande que podemos lá passar horas e horas sem qualquer aborrecimento. Depois de entrarmos, o caminho leva-nos até à Colher de Jardineiro, de Claes Oldenburg e Coosje van Bruggen, uma escultura gigante que fica na entrada da monumental Alameda dos Liquidâmbares, árvores de tronco acinzentado, nativas dos Estados Unidos, que no Outono adquirem uma coloração avermelhada particularmente atractiva.

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Em frente à famosa casa cor-de-rosa estende-se o Parterre Central, uma área plana com relvados rodeados de árvores e vários pequenos tanques de água interligados, que culminam num lago hexagonal com uma fonte ao centro. Uma das laterais do Parterre abriga um amplo roseiral, onde buxos cuidadosamente alinhados e recortados em formas geométricas delimitam as roseiras, e uma comprida pérgula adjacente oferece sombra a quem passa, bem vinda nos dias em que o sol está mais forte.

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Uma escadaria em vários níveis leva-nos do Parterre até ao lago, rodeado de grandes árvores e de recantos para descobrir: um fio de água que escorre entre fetos e avencas, uma gruta onde o brilho do lago se reflecte, bancos forrados de azulejo, convidando ao descanso nas tardes quentes, um caminho de pedras. Em volta adensa-se a mata, onde a vegetação cresce em liberdade é por isso mais cerrada.

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Pelos vários espaços do Parque estão expostas em permanência esculturas que fazem parte do acervo do Museu, estrategicamente colocadas em estreita simbiose com o ambiente que as rodeia.

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Uma grande área do Parque é ocupada pela quinta pedagógica, um imenso prado verde onde se alojam e vagueiam os animais que tipicamente encontramos nas quintas – vacas, patos, cavalos, porcos – e que inclui uma horta e um jardim de aromáticas.

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Na extremidade leste do Parque foi construída a Casa do Cinema Manoel de Oliveira, inaugurada em Junho de 2019 como espaço expositivo, documental e de exibição dedicado ao cinema contemporâneo.

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A inovação mais recente do Parque foi a instalação e abertura, também em 2019, de um passadiço elevado (o Treetop Walk) na área mais arborizada a leste do lago. Caminhando ao nível das copas das árvores é-nos oferecida uma perspectiva completamente diferente da cobertura vegetal de Serralves. Ao longo do percurso estão dispostos painéis explicativos sobre particularidades que podemos observar, e toda a experiência é simultaneamente enriquecedora, divertida e fascinante – quase como uma aventura.

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A CASA

 

A Casa de Serralves é o edifício Art Deco mais notável do nosso país. Foi construída entre 1925 e 1944, e o seu projecto está atribuído a Charles Siclis, arquitecto francês, e a José Marques da Silva, um arquitecto português que também criou outros edifícios emblemáticos do Porto.

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Quando o Estado português adquiriu Serralves, a ideia subjacente foi usar a Casa como local para exposições temporárias de obras de arte moderna e contemporânea, utilidade que lhe foi dada até à abertura das novas instalações do Museu em 1999. O icónico edifício cor-de-rosa foi depois alvo de uma cuidadosa restauração e actualmente o seu interior pode ser visitado.

 

Infelizmente, a Casa apresenta-se praticamente vazia, pois todo o seu mobiliário e outras peças decorativas foram vendidos pelo último dono, o Conde de Riba d’Ave, indo contra a vontade expressa do proprietário original. A ausência de elementos distractivos tem no entanto a vantagem de nos revelar a essência da Casa em toda a sua pureza, e sobretudo a forma como interage com o espaço exterior e a sua luminosidade ao longo das várias fases do dia – com a fachada principal orientada para sudoeste e situada no topo do Parterre Central do Parque, é inundada pela luz solar durante grande parte do dia, e a visão de quem está dentro de casa prolonga-se por centenas de metros de áreas verdejantes. Permite-nos também perceber a geometria que predomina em todos os ambientes e nos pormenores arquitectónicos que tornam o seu interior tão original quanto o exterior.

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O MUSEU

 

A constituição da Fundação de Serralves em 1989 foi o primeiro passo para a criação do Museu de Arte Contemporânea que conhecemos hoje, e cujo projecto teve como autor o nosso mais consagrado arquitecto, Álvaro Siza Vieira. A construção do edifício iniciou-se em 1996, e a 6 de Junho de 1999 foi inaugurado o novo edifício, localizado no extremo oeste da propriedade. É uma construção discreta, com formas e materiais simples, sem pretensões de tirar o protagonismo às atracções mais antigas de Serralves, e bem integrada no ambiente que a rodeia.

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Visto de fora, não fazemos ideia de como o interior do Museu é amplo e bem adaptado a exposições de todos os tipos, mesmo as que implicam obras de arte com tamanhos consideráveis. O espaço expositivo divide-se pelos três pisos dos vários corpos da construção, e a disposição das salas aproveita os níveis desiguais do edifício, que está implantado num terreno em declive.

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Para celebrar os 20 anos de existência do espaço, em 2019 o Museu organizou uma grande exposição dedicada ao autor do edifício e às suas criações arquitectónicas ao longo de mais de seis décadas. Foram exibidas maquetes de inúmeros trabalhos de Álvaro Siza, concretizados ou não, acompanhados dos cadernos onde o arquitecto esquissa as suas ideias para cada projecto. Uma exposição memorável em homenagem de um homem que continua a ser um dos maiores nomes da arquitectura contemporânea mundial, e cujo mérito foi reconhecido com o prémio Pritzker em 1992.

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O Museu tem também uma loja, uma biblioteca, um auditório, e vários espaços de refeição: salão de chá, bar, e um restaurante que funciona em sistema de bufete e disponibiliza uma esplanada com vista sobre uma parte do Parque, muito agradável para os dias mais amenos.

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A importância de todo conjunto patrimonial de Serralves foi reconhecida com a sua classificação como Monumento Nacional em 2012.

 

Se ainda não conhecem, na vossa próxima visita ao Porto não se esqueçam de reservar tempo para ir a Serralves e usufruir de tudo o que este maravilhoso espaço, único no nosso país com estas características, tem para oferecer.

 

(Este roteiro foi publicado pela primeira vez no website Fantastic)

 

Leiam também: Roteiro de fim-de-semana: dois dias no Porto

 

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