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Viajar porque sim

Paixão por viagens, escrita e fotografia

Seg | 02.07.18

No comboio histórico do Douro

 

Viajar de comboio faz parte do imaginário de todos os viajantes, mesmo daqueles para quem entrar num comboio pertence à rotina das deslocações diárias casa-trabalho. Há qualquer coisa de relaxante nesta forma de deslocação. Talvez seja o som ritmado e peculiar das rodas a deslizarem sobre os carris, ou aquela oscilação típica que nos embala, ou ainda o efeito hipnótico da paisagem que desfila a alta velocidade perante os nossos olhos. O fascínio das viagens de comboio perdura desde os tempos das primeiras linhas férreas e sempre esteve muito além da sua utilidade prática como meio de transporte para cobrir mais rapidamente grandes distâncias antes da invenção dos aviões. Democráticos apesar da segregação em classes, foram desde o início utilizados tanto para transporte de mercadorias como de pessoas, e neste caso por pessoas de todas as condições socioeconómicas. Em constante evolução e renovação para se adaptarem ao progresso, os comboios continuam a ser populares em praticamente todo o mundo.

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Acompanhando a tendência da diversificação na oferta turística, a recuperação de máquinas e carruagens antigas para serem colocadas ao serviço de rotas ferroviárias particularmente atraentes também chegou a Portugal, e a CP começou há alguns anos a disponibilizar passeios em comboios históricos. O mais antigo e conhecido é o Comboio Histórico do Douro, e é nele que vou levar-nos em mais uma viagem.

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O Comboio Histórico do Douro funciona nos meses de Junho a Outubro aos sábados e domingos. Sai ao início da tarde da estação de Peso da Régua e acompanha o percurso do rio Douro até à estação de Tua, com uma breve paragem intercalar no Pinhão. A viagem para cada lado demora cerca de 80 minutos e o passeio inclui uma paragem de cerca de meia hora em Tua antes do regresso à Régua. 

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A composição tem cinco carruagens históricas – três em madeira escura, duas pintadas de verde – que são puxadas pela locomotiva a vapor 0186, construída em 1925 pela Henschel & Sohn uma empresa que funcionou entre 1810 e 1957 em Kassel, na Alemanha. A 0186 foi uma de dez locomotivas que chegaram a Portugal nos anos 1924-25 como parte do pagamento da dívida da Alemanha causada pela Primeira Guerra Mundial. Pesa umas “meras” 98 toneladas e tem um esforço de tracção de quase 11 toneladas. É uma verdadeira preciosidade.

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Funcionando anteriormente a carvão mineral, em 2013 foi alterada para operar a diesel – a logística complicada e o fumo provocado pelos 1500 kg de carvão consumidos numa viagem de ida e volta entre a Régua e Tua foram substituídos pela simplicidade de abastecimento e o menor volume de 400 litros de gasóleo para o mesmo percurso.

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Bastante antes da hora marcada para a partida, a 0186 já atrai as atenções de quem passa ao pé da estação da Régua: a locomotiva requer algumas horas de cuidados intensivos antes de começar a sua viagem, e o fumo que produz eleva-se no ar de forma bem visível, por detrás dos edifícios da estação. Isso e o barulho, claro, que o som do vapor também se ouve à distância.

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A viagem é animada por um grupo de cantares regionais, que começam devotadamente a sua função quando ainda estamos na plataforma, enquanto as atenções do futuros viajantes se dividem entre um olhar atento aos pormenores da locomotiva e as poses da ordem em frente à dita cuja, “para mais tarde recordar”. Enquanto o comboio não enche, é a melhor altura para explorar o interior das carruagens, recuperadas a preceito para nos sentirmos transportados no tempo.

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Finalmente, mesmo à hora estipulada e depois de um rapazito simpático nos ter oferecido um “cálice” (em copo plástico, claro está) de vinho do Porto, o Comboio Histórico inicia a sua viagem entre fumarolas e apitos estridentes. A carruagem está quase vazia, o que é de estranhar porque os bilhetes costumam esgotar com muitas semanas de antecedência. Melhor assim. Talvez porque os comprámos cedo, temos a sorte de ir junto à janela do lado onde corre o Douro, o que quer dizer que temos a melhor paisagem garantida durante todo o percurso.

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Na paragem de 10 minutos no Pinhão a carruagem é invadida por um volumoso grupo de excursionistas seniores – percebemos agora porque é que estava tão vazia, e percebemos também que se acabou a tranquilidade, mais ainda quando os cantantes de serviço decidem durante prolongados minutos assentar arraiais no (já de si exíguo) espaço entre os bancos. Realmente, animação é coisa que não falta a bordo do comboio…

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Pela janela vão passando rapidamente árvores e arbustos, uma estação de vez em quando, molhes com barquitos atracados, quintas e solares na outra margem, sempre tendo como nota dominante o azul do rio e o verde dos socalcos vinhateiros. Está sol e calor, e sabe bem o ventinho que entra pelas janelas abertas, mesmo que isso signifique um aumento exponencial do ruído da deslocação das vetustas carruagens.

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No Douro, o movimento é mais que muito. Embarcações de recreio sobrem e descem o rio, e barcos de excursões dos mais variados tipos competem em velocidade com o comboio, respondendo na mesma moeda aos apitos de saudação lançados pela locomotiva.

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A linha férrea do Douro tem uma única via, e só nalgumas estações ela se divide para permitir o cruzamento de comboios que se deslocam em direcções opostas. É por isso que na estação do Tua encontramos outro comboio histórico, a aguardar pacientemente a chegada do nosso: o MiraDouro, que circula habitualmente entre Porto-São Bento e a Régua mas desta vez veio até ao Tua por qualquer razão especial. As carruagens do MiraDouro são mais recentes, foram fabricadas na década de 40 pela Schindler, na Suíça, e só deixaram de estar no serviço regular da CP em 1977. Pelo design e pelas cores dá para perceber bem a diferença de idades entre as composições dos dois comboios.

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Enquanto a locomotiva é separada das carruagens e decorrem as manobras para a colocar na outra extremidade do comboio, temos tempo de sobra para ir comer qualquer coisa no café junto à estação ou visitar a mostra de produtos regionais especialmente preparada para quem faz esta viagem, numa sala onde estão também expostos alguns objectos em tempos usados nas operações ferroviárias. Cá fora, sob a protecção do telheiro da plataforma, a animação continua em alta, com alguns viajantes a aderirem entusiasticamente à actuação do grupo de cantares regionais.

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No regresso, o percurso é o mesmo mas vemos a paisagem de outra perspectiva, e sob outra luz. O sol está mais baixo no horizonte, refulgindo na água, e as sombras estendem-se ao lado da linha. A tarde já vai longa e a energia começa a quebrar, os ânimos estão mais tranquilos. Depois de nova paragem no Pinhão, que aproveitamos para ver os famosos azulejos, são seis e meia da tarde quando reentramos na estação da Régua e termina a nossa viagem ao passado no Comboio Histórico do Douro.

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Depois, para um final de dia a condizer, a melhor opção é descer até ao cais para aproveitar o pôr-do-sol numa esplanada, com um petisco e uma bebida fresca a acompanhar, e fazer um brinde: viva o Douro!

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As minhas SUGESTÕES

 

Passear

 

Miradouro de São Leonardo da Galafura – vista fantástica sobre o Douro

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Estrada Nacional N222 entre Régua e Pinhão – uma das estradas mais bonitas do país

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Dormir

 

Quinta da Travessa (Covelinhas)

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Pousada do Solar da Rede (Mesão Frio)

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Comer

 

São Leonardo (São Leonardo da Galafura)

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Bar do Cais (Régua)

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Pastelaria Solar d’Ouro (Régua)

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  (publicado na rubrica Viagens da revista Inominável nº 14)

 

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