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Viajar porque sim

Paixão por viagens, escrita e fotografia

Seg | 29.01.18

E Marrocos aqui tão perto

 

No estreito de Gibraltar, apenas 15 km mal medidos de água do mar separam Tarifa, no extremo sul de Espanha, de Tânger, no norte de Marrocos. A partir do Rochedo de Gibraltar, em dias claros é possível ver nitidamente o Jbel Moussa, a montanha com 850 metros que se ergue no extremo norte da costa marroquina. Há mais de cinco dezenas de travessias de ferry diárias que ligam Tânger às cidades espanholas de Algeciras e Tarifa. E todos os dias há voos directos que unem Portugal a várias grandes cidades marroquinas – como Casablanca, Marraquexe ou Fez – em pouco mais de uma hora. Marrocos está mesmo muito perto de nós.

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E no entanto, em Marrocos parece que estamos a muitos milhares de quilómetros do nosso país, como se num tão curto espaço de tempo tivéssemos atravessado meio mundo para lá chegar. Viajar em Marrocos não é só viajar no espaço para um outro continente – é viajar também no tempo, recuando para uma realidade que era em certos aspectos nossa ainda não há 50 anos, e viajar no nosso imaginário para tentar encontrar pontos de contacto entre a ideia (quiçá romântica) que temos deste país e aquilo que ele realmente é: um cadinho de culturas, de surpresas, e de anacronismos.

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Com uma área cinco vezes maior que a de Portugal e quase 13 séculos de existência (o primeiro estado marroquino foi fundado em 788), e com uma cultura que mistura influências berberes, árabes, europeias e da África subsaariana, em Marrocos há evidentemente muito para ver e absorver. Há cidades modernas como Casablanca ou Rabat, estâncias balneares criadas para satisfazer o turismo de massas, montanhas onde se esquia no Inverno, e grandes áreas de deserto onde nem sequer faltam enormes dunas de areia. Há ruínas romanas, aldeias que são cenários de filme, desfiladeiros rochosos, bosques de cedros, palmeirais que se perdem de vista, medinas labirínticas e, sobretudo, um mundo de contrastes onde o tradicional e o moderno coabitam em partes iguais sem grandes atropelos aparentes.

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Entre o tanto que há para conhecer em Marrocos, há contudo alguns lugares que são incontornáveis e merecem uma visita mais atenta e demorada. Estes são apenas alguns deles.

 

 

CHEFCHAOUEN

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Esta pequena cidade azul e branca é um dos locais mais turísticos do país, mas consegue no entanto conservar um ambiente tranquilo e um encanto muito especial. Mantendo as suas características mais tradicionais – ruelas e escadarias estreitas e sinuosas, onde os gatos são uma constante e até encontramos cabras à solta, roupa a secar ao sol em frente às casas, restaurantes onde nos sentamos em cadeiras baixinhas e canapés estofados – está apesar disso mais “europeizada”, facto a que não será certamente alheia a sua posição geográfica no país, já bastante a norte.

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A não perder: os cantos e recantos que encontramos ao virar de cada esquina. Chaouen (como também é conhecida) é perfeita para nela nos perdermos durante horas sem nunca sentir aborrecimento.

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FEZ

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A segunda maior cidade marroquina (a maior é Casablanca) está na realidade dividida em três zonas bem distintas: Fes-el-Bali (a cidade antiga, fundada no séc. VIII); Fes-el-Jdid (a parte nova, construída no período em que o país foi protectorado francês, entre 1912 e 1956); e o Méchouar, o complexo do palácio real. Fez é a mais antiga cidade imperial de Marrocos e foi por diversas vezes capital do país; pela sua importância histórica, cultural e espiritual é também um dos ícones da civilização islâmica. Menos divulgada turisticamente do que outras suas congéneres, Fez é provavelmente a cidade mais interessante de Marrocos, e aquela que merece mais tempo de visita.

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A não perder: a medina de Fes-el-Bali; classificada como Património Mundial pela Unesco desde 1981, tem várias particularidades que a tornam especial – é a maior zona livre de veículos automóveis do mundo, um perímetro murado com 20 quilómetros que ocupa 350 hectares e contém no seu interior 9400 vielas, mais de 13 mil edifícios, 3 mil monumentos históricos, e cerca de 200 mil fassi (habitantes de Fez); abriga, entre muitas outras jóias, a universidade de al Quaraouiyine, fundada em 859, o que faz dela a mais antiga universidade do mundo ainda em funcionamento; e no souq dos curtumes, uma ampla (e fétida…) área ao ar livre, as peles de animais continuam a ser tratadas manualmente em grandes tanques por homens imersos na água até à cintura, num processo que quase não mudou desde os tempos medievais. Numa primeira visita à medina vale muito a pena contratar um bom guia oficial, que nos leva prontamente a todos os locais de interesse e nos elucida sobre muitos aspectos da cultura e da sociedade marroquinas.

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VOLUBILIS

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Marrocos consegue manter ainda vários segredos pouco divulgados, e as ruínas romanas de Volubilis são um deles. Engane-se quem julgar, vendo o local ao longe, que são meia dúzia de pedras sem interesse. Também classificado (desde 1997) como Património Mundial pela Unesco, o local está a ser actualmente escavado e recuperado, pondo a descoberto belíssimos mosaicos e algumas estruturas (relativamente) intocadas. A cidade foi fundada pelos cartagineses no séc. III a.C., mas foram os romanos que a desenvolveram, sensivelmente a partir de 25 d.C. Foi uma cidade próspera e vibrante, tendo atingido no seu auge uma população de 20 mil almas. Abandonada no séc. XI, e mais tarde extremamente danificada pelo terramoto de 1755 (sim, esse mesmo, o que destruiu Lisboa), muitos dos elementos arquitectónicos em mármore que ali subsistiam foram retirados do local para uso na cidade de Meknès, que fica a cerca de 30 km – duas das colunas coríntias que ornam a famosíssima porta Bab Mansour, em Meknès, vieram de Volubilis. Em 2011 foi construído, junto à entrada do sítio arqueológico, um moderno edifício que funciona como museu e centro de apoio aos visitantes.

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A não perder: a melhor hora para visitar Volubilis é à tarde, quando o sol já começa a declinar – para evitar a hora de maior calor e também para usufruir do bonito pôr-do-sol naquele ambiente especial. E se alguém vos disser que meia hora chega para visitar o local, não acreditem: Volubilis é para ser apreciada com calma.

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AZROU

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Aninhada no Atlas, e tal como a vizinha cidade de Ifrane, Azrou deve grande parte da fama à sua estância de esqui e por isso é sobretudo frequentada no Inverno. Aqui a arquitectura reflecte totalmente essa vocação, e parece que estamos numa qualquer cidadezinha alpina e não em pleno norte de África. Mas o maior ponto de interesse desta zona durante todo o ano é o bosque de cedros que se estende às portas da cidade, e sobretudo os seus habitantes especiais: os macacos-berberes (ou macacos-de-gibraltar). Apesar de a sua população estar a diminuir drasticamente, ainda é relativamente fácil vê-los mesmo junto à estrada que passa pelo bosque – e não é raro ter de parar o carro para deixar que atravessem sem riscos de atropelamento.

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A não perder: tentar ver os macacos, obviamente. Não é permitido parar o carro na estrada, mas é obrigatório reduzir (muito!) a velocidade, pelo que com um pouco de sorte é possível avistar alguns. O ideal será fazer um percurso a pé pelo bosque, com cedros lindíssimos, alguns deles bem antigos – estima-se que o mais velho de todos, o Gourand, terá mais de 800 anos de idade.

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MERZOUGA

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Esta pequena aldeia berbere está situada mesmo junto ao Erg Chebbi, um dos dois ergs do Saara marroquino, e como tal é inteiramente devotada ao turismo. Apesar disso mantém um ambiente tranquilo e modorrento, próprio das regiões desérticas quentes. A pé ou de camelo é muito fácil chegar à zona dunar, e não é preciso andar muito para nos vermos completamente rodeados de areia. Menos fácil é no entanto tentar atingir o topo das dunas mais altas, que chegam aos 150 metros – a subida é muito mais íngreme do que parece, e os pés enterram-se na areia fina, o que não ajuda nada a progressão. Um verdadeiro desafio! Por aqui é também possível pernoitar em tendas berberes, devidamente adaptadas com maior ou menor conforto (consoante o preço) aos tempos modernos.

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A não perder: passear nas dunas, obviamente, de preferência ao pôr-do-sol; os passeios de camelo são muito populares entre os turistas (e são uma experiência interessante, pela singularidade da posição e do movimento ondulante do animal), mas infelizmente nem sempre os animais são bem tratados, sobretudo quando se mostram mais teimosos; já passear a pé é uma actividade perfeitamente compatível com as boas práticas de viagem, e muito saudável – desde que, obviamente, não se escolha a hora de maior calor, e se leve muita água.

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GARGANTAS do TODGHA

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Na zona leste das montanhas do Alto Atlas, o rio Todgha abriu o seu caminho no solo pedregoso e escavou desfiladeiros fundos entre paredes rochosas, formando escarpas que atingem por vezes 200 metros de altura. Reduzido a um pequeno ribeiro na época seca, quando chove o Todgha aumenta rapidamente de caudal e percorre o desfiladeiro numa torrente impetuosa e lamacenta, chegando por vezes a cortar a estrada e até mesmo a destruir algumas das pequenas pontes erguidas ao longo do caminho. Nestas alturas a forma mais segura de percorrer o desfiladeiro é num todo-o-terreno, pois certas passagens têm de ser feitas a vau.

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A não perder: a zona mais grandiosa das gargantas é a parte final (para quem vem de norte), onde o rio corre apertado entre paredes verticais com 160 metros de altura.

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KSAR de AIT-BEN-HADDOU

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Em Marrocos, um ksar é uma cidade fortificada, e o de Ait-Ben-Haddou está também designado pela Unesco como Património Mundial. Fundado no séc. VIII e formado por um conjunto de vários kasbahs (castelos) erguidas junto a um rio, o Ksar de Ait-Ben-Haddou é um fantástico exemplo da arquitectura tradicional do sul de Marrocos, com os seus edifícios feitos de lama. Apesar de hoje já serem muito poucas as famílias que ali vivem (há uma aldeia mais recente do outro lado do rio), a popularidade turística deste ksar tem ajudado à sua manutenção e recuperação, a que também não é alheio o facto de ser desde há pelo menos 50 anos lugar eleito como cenário de vários filmes e séries (sendo a mais recente a famosa Guerra dos Tronos).

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A não perder: subir até à muralha erguida no topo da aldeia para ter uma visão de 360° sobre o ksar e o vale circundante.

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KASBAH de TÉLOUET

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Este é mais um dos segredos de Marrocos. Numa aldeia perdida no Atlas, a 1800 metros de altitude e disfarçadas por um exterior (infelizmente) em ruínas, neste kasbah subsistem bem conservadas algumas salas de um dos mais bonitos palácios marroquinos: o Dar Glaoui. Local de passagem das caravanas que ligavam o Saara a Marraquexe e próximo de grandes minas de sal, em finais do séc. XIX Télouet era uma localidade próspera e a capital da tribo berbere dos Glaoua. No sistema feudal ainda em vigor na época, o líder da tribo detinha vantajosos poderes administrativos, conferidos pelo sultão, numa área que chegou a abranger grande parte dos territórios a sul de Marraquexe. O Kasbah de Télouet cresceu consideravelmente quando em 1912 Thami El Glaoui herdou a liderança dos Glaoua e o título de paxá de Marraquexe. O palácio foi aumentado e redecorado com pisos de madeira de cedro pintado e com ornamentos de estuque e azulejos coloridos nas paredes – e consta que o complexo terá chegado a albergar mais de mil pessoas. Tendo sido manifestamente apoiante dos franceses, quando Marrocos resgatou a sua independência El Glaoui caiu em desgraça, e depois da sua morte em 1956 o kasbah foi deixado ao abandono até 2010, altura em que começou a ser lentamente recuperado.

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A não perder: compensa pagar a um dos “guias” que se encontram à entrada do caminho de acesso ao kasbah – o valor que cobram é reduzido (aliás em Marrocos quase tudo é barato, pelos nossos padrões) e ficamos a conhecer com maior detalhe a história do kasbah e da região. 

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MARRAQUEXE

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É provavelmente a cidade marroquina que mais turistas atrai, e aquela em que se pensa imediatamente quando se fala de Marrocos. Também cidade imperial e antiga capital do país, é conhecida como “cidade vermelha”, pela cor das suas muralhas e de muitos edifícios. Eu substituiria “vermelho” por “rosa” – aquele rosa escuro e profundo em que se transforma o vermelho depois de muito queimado pelo sol. Cheia de contrastes, aqui coabitam o velho e o novo, a tradição e a modernidade, o básico e o luxuoso. Com quase 1 milhão de habitantes, a cidade acorda cedo e adormece tarde. As grandes avenidas da parte nova têm um trânsito intenso, e a extensa e labiríntica medina é quase caótica, com motoretas, bicicletas e carroças apressadas a passarem “tangentes” aos peões e um cheiro permanente a combustível no ar. Na segunda metade do século passado Marraquexe “caiu no goto” de algum jet set artístico e a cidade tem vindo consistentemente a popularizar-se como destino turístico de eleição (na minha opinião muito pessoal, talvez até demasiado para o que merece, pelo menos por comparação com outras cidades de Marrocos).

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A não perder: os Jardins Majorelle e o Museu Berbere, na propriedade que pertenceu a Yves Saint-Laurent, e ao lado o recém-aberto museu dedicado a este famoso costureiro; dentro da medina, a Madraça de Ben Youssef, antiga e reputada escola corânica; e, como é óbvio, a incontornável Praça Djemaa el-Fna, com o seu ambiente tão peculiar – mas só depois de entardecer, que durante o dia é apenas mais um lugar de passagem sem grande interesse particular.

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(publicado na rubrica Viagens da revista Inominável nº 11)

 

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Ter | 16.01.18

O Trilho da Mina de Ouro do Conhal

 

Fresquinho, fresquinho, praticamente acabado de inaugurar – há precisamente um mês – o PR9 NIS Trilho da Mina de Ouro do Conhal (não confundir com o PR4, que também é conhecido como Trilho do Conhal) é um percurso pedestre fácil, extremamente bonito e com variados pontos de interesse. Uma verdadeira e muito agradável surpresa.

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Este trilho desenvolve-se entre Santana, na aldeia do Arneiro, e a área junto ao rio Tejo a que se dá o nome de Pego das Portas, passando depois pela zona conhecida como Conhal. São 8,5 km que se percorrem facilmente (no sentido dos ponteiros do relógio) em cerca de 3 horas e com um desnível entre a altura máxima e mínima de apenas cerca de 140 metros.

 

Embora o circuito esteja situado dentro do Concelho de Nisa, o acesso mais rápido (para quem vem de oeste) é pela saída da A23 que nos leva até Vila Velha de Ródão, passando depois a ponte para continuar pela N18 na direcção de Nisa até ao desvio para o Arneiro.

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O ideal é começar o passeio pela visita ao Centro Interpretativo do Conhal, que fica na antiga Escola Primária, ao pé da igreja (não usem o Google Maps, vai mandar-vos para um sítio errado; basta seguirem a seta que indica “escola”, ou então perguntem a alguém). No Centro Interpretativo, que mantém a traça original da escola, é possível ver um vídeo sobre o conhal, para percebermos melhor o percurso além de ficarmos a conhecer alguns pormenores sobre a etnografia e a vocação da aldeia do Arneiro. No piso de cima há um espaço especialmente concebido para as crianças, mas a sala mais bonita é a dedicada ao rio Tejo e à actividade piscatória tradicional da aldeia, onde está exposto um picareto (barco típico) e cujo chão está absolutamente original, lindíssimo e muito bem executado.

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O percurso tem início mesmo ao lado do Centro Interpretativo, e começa logo com uma subida. Mas não se assustem – não é muito grande e no resto do caminho apenas há mais duas ou três subidas ligeiras nesta parte inicial, que se desenvolve no topo do monte, e outra lá mais para o fim, ao regressar à aldeia.

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Do marco geodésico que marca o ponto mais alto – a Serrinha, 211 metros acima do nível do mar – temos uma vista panorâmica sobre a área circundante, com a mancha de pedra acastanhada do Castelo do Rei Vamba a destacar-se na distância. Deveria estar rodeado de verde, mas o incêndio que lavrou em finais de Julho do ano passado nas Portas de Ródão transformou o verde em castanho, e por entre os esqueletos carbonizados dos pinheiros a cor que mais sobressai é o cinzento do granito.

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Trilho da mina de ouro do Conhal - Portas de Ród

Deste lado, felizmente, o cenário é diferente e depois de uma primeira parte algo insípida (por falta de vegetação) entramos numa zona bem arborizada. Aqui a espécie vegetal característica a destacar é o zimbro – uma espécie de baga (na realidade está mais perto de ser um fruto) que adquire uma cor muito escura quando amadurece. Só para se situarem, são estas bagas que dão o principal sabor ao gin, portanto eu não aconselharia que experimentassem comê-las…

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A parte mais deliciosa do passeio começa quando chegamos ao miradouro da Serrinha. O arvoredo abre e de repente entra-nos pelos olhos o azul-forte do Tejo, que ali, deste lado das Portas de Ródão, é um enorme espelho de água parada a reflectir a cor do céu. Deslumbrante é o adjectivo mínimo que se pode usar para descrever a paisagem. O rio transformado em lago, onde nem sequer falta uma quase-ilha (a Ilha das Virtudes), rodeado de verde, com as Portas como fundo… O sossego, só quebrado pelos ruídos habituais na natureza, os pássaros que piam, o ladrar de um cão, um balido de ovelha ou o som dos seus chocalhos. E até um banquinho estrategicamente colocado convida a descansar um pouco e apreciar tudo isto.

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Trilho da mina de ouro do Conhal - Miradouro da Se

Trilho da mina de ouro do Conhal - Portas de Ród

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A descida que se segue é algo íngreme, mas quem concebeu este trilho pensou em tudo e foram instalados degraus de madeira e um corrimão para ajudar. E lá vamos nós por ali abaixo, sempre na abençoada sombra das árvores, até termos água novamente à frente dos nossos olhos. Aqui é a foz da Ribeira do Vale, e no sítio onde a ribeira se encontra com o Tejo formou-se uma ilha a que dão o nome de Cabecinho.

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Trilho da mina de ouro do Conhal - Ilha do Cabecin

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Trilho da mina de ouro do Conhal - foz da Ribeira

Trilho da mina de ouro do Conhal - foz da Ribeira

Para viabilizar este percurso foram construídas duas pontes suspensas, a primeira sobre a Ribeira do Vale e a segunda um pouco mais à frente, para ligar à ilha do Cabecinho. Neste sítio já estamos pouco acima do nível do Tejo e mais perto das Portas de Ródão. A Ilha das Virtudes, junto à outra margem do rio, é local de poiso de inúmeras aves, sobretudo corvos-marinhos e cegonhas. O ideal é levar binóculos ou uma máquina com um bom zoom para observar a passarada – sobretudo os corvos-marinhos, que são muito engraçados quando decidem ficar imóveis de asas abertas, a apanhar sol. Gosto imenso de observar animais em liberdade. Quando era miúda e viajava de carro em Portugal com os meus pais não era muito habitual ter estes “encontros imediatos”, a não ser com aqueles animais mais corriqueiros, como patos ou gaivotas, eventualmente uma cegonha ou uma lebre. Não sei se era por haver menos diversidade de fauna, por não estar desperta para observar atentamente, ou porque os lugares onde íamos não eram suficientemente “selvagens”, mas a verdade é que hoje em dia nestes percursos (e não só) conseguimos ver ou pelo menos vislumbrar uma grande variedade de animais nos seus habitats.

Trilho da mina de ouro do Conhal - foz da Ribeira

Trilho da mina de ouro do Conhal - foz da Ribeira

Trilho da mina de ouro do Conhal - foz da Ribeira

Portas de Ródão - corvos-marinhos na ilha das Vi

Portas de Ródão - corvos-marinhos na ilha das Vi

Portas de Ródão - corvos-marinhos na ilha das Vi

Portas de Ródão - cegonhas na ilha das Virtudes.

A ilha do Cabecinho é pequenina – uma ilhota, a bem da verdade. Tem uma casa em ruínas e muitos pinheiros. Também tem agora uma mesa e bancos, que obviamente darão muito jeito a quem quiser piquenicar ou simplesmente descansar um bocado.

Trilho da mina de ouro do Conhal - Ilha do Cabecin

Trilho da mina de ouro do Conhal - Ilha do Cabecin

Trilho da mina de ouro do Conhal - Ilha do Cabecin

Trilho da mina de ouro do Conhal - Ilha do Cabecin

Trilho da mina de ouro do Conhal - Ilha do Cabecin

Saindo da ilha novamente pela ponte, o percurso continua sempre junto ao Tejo, primeiro entre oliveiras e depois no meio de vegetação mais cerrada. Passam-se umas ruínas identificadas como “Abrigo do Pescador” e pouco depois entramos em campo aberto. Estamos no Pego das Portas, local onde em tempos existiu um cais para as barcas que aqui faziam a travessia entre as duas margens do Tejo. As barcas já desapareceram, mas a vocação do lugar mantém-se, agora com um ancoradouro para as embarcações mais modernas que são actualmente utilizadas para a pesca no rio.

Trilho da mina de ouro do Conhal - Abrigo do Pesca

Trilho da mina de ouro do Conhal - Pego das Portas

Trilho da mina de ouro do Conhal - Pego das Portas

Trilho da mina de ouro do Conhal - Pego das Portas

Trilho da mina de ouro do Conhal - Pego das Portas

Mas este local é especial também por outras razões: é deste lado das Portas de Ródão que podemos ver os grifos que fazem parte da maior comunidade destas aves existente no nosso país. Claro que só conseguimos vê-los de longe, pairando junto às escarpas ou sobre as nossas cabeças, embora conste que se aproximam mais nos dias em que os alimentadores da Quercus vêm distribuir comida. Também estes grifos, além de outras espécies de aves, foram afectados pelos incêndios de Julho, tendo ficado reduzidos a menos de metade.

Trilho da mina de ouro do Conhal - Pego das Portas

Trilho da mina de ouro do Conhal - Pego das Portas

Trilho da mina de ouro do Conhal - Pego das Portas

A partir do Pego das Portas o percurso muda significativamente de aspecto e faz-se quase todo pela estrada de terra batida que segue para a aldeia do Arneiro. Logo a seguir ao Pego passa-se entre uns barracões guardados por dois enormes cães (que estão presos por correntes e não param de ladrar furiosamente enquanto passamos) e mais à frente vira-se à direita seguindo a placa que indica Castelejo. É aqui que entramos verdadeiramente na zona que dá o nome ao trilho: o Conhal do Arneiro.

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Aquando da ocupação da Península Ibérica pelos Romanos, desenvolveu-se nesta área uma exploração mineira de ouro de aluvião que se prolongou até à Idade Média, passando depois a ser feita de forma bem menos regular até ao século passado, segundo consta. Daqui terão saído mais de 3 toneladas de ouro na época romana. A técnica usada para extrair o ouro fazia uso da força motriz da água que vinha das serras adjacentes através de canais escavados. As pedras maiores iam sendo retiradas manualmente e transportadas para sítios mais afastados da zona de exploração, para não atrapalharem os trabalhos. Essa área cobre hoje entre 60 e 70 hectares, e a sua grandeza é bem visível do alto das Portas de Ródão: são pilhas e pilhas de calhaus rolados (conhos) amontoados por entre as árvores e os arbustos que ladeiam o caminho que nos leva até ao Castelejo.

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O Castelejo é uma pequena elevação no meio do Conhal, de onde conseguimos ter alguma percepção da magnitude do empreendimento que foi levado a cabo na zona. Há locais onde as pilhas de conhos terão chegado a atingir cinco metros de altura, mas antes da sua classificação como área arqueológica e geossítio do Geoparque Naturtejo da Meseta Meridional muita desta pedra foi vendida para brita (na sua maioria a empresas espanholas, segundo nos foi dito).

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De regresso à estrada, a parte final do percurso faz-se entre oliveiras perfiladas de ambos os lados – quase parecem soldados a guardar um ouro que já há muito desapareceu.

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Até ao Arneiro é mais uma meia hora de caminho, mas ao atravessar a aldeia o melhor mesmo é fazer uma paragem para repor energias e conhecer a gastronomia tradicional da zona, cujo prato mais genuíno são as sopas de peixe (carpa, geralmente). “O Túlio” é o restaurante ideal, por várias razões. Atendem-nos a qualquer hora, desde que se marque com alguma antecedência e depois se avise uma meia hora antes de chegar, para poderem começar a preparar a comida. Indo após a enchente do almoço ficamos com o restaurante por nossa conta, e assim dá para apreciar com calma o peixe frito que servem de entrada, as sopas de peixe (de preferência regadas a Alvarinho), e no fim um belo arroz doce. Depois, a cereja no topo do bolo: o Sr. Inácio (um dos donos da casa) vai buscar a viola e de repente estamos em plena tertúlia musical, onde desfilam Pink Floyd à mistura com temas originais cantados em português. Uma delícia!

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Já quase a chegar à Igreja de Santana e ao Centro Interpretativo, um grupo de senhoras sentadas em banquinhos aproveita o agradável sol do fim de tarde, enquanto as mãos se afadigam com agulhas e linhas. Uma delas, a D. Nazaré, tem à sua frente um rebolo cheio de alfinetes, e enquanto trabalha ouvem-se os barulhinhos secos de madeira a bater contra madeira: é uma lindíssima peça em renda de bilros que cresce perante os nossos olhos, pasmados e baralhados pela rapidez com que ela constrói pétalas e folhas com simples movimentos e trocas daquelas pequenas peças de madeira onde se enrola uma linha branca e fininha. É quase uma dança... Uma arte que está a desaparecer aos poucos no nosso país – porque é difícil e requer dedicação, talento e gosto, um conjunto de virtudes que estão em extinção, tal como esta renda.

Trilho da mina de ouro do Conhal - Igreja de Santa

Trilho da mina de ouro do Conhal - Igreja de Santa

Trilho da mina de ouro do Conhal - Arneiro - Renda

Trilho da mina de ouro do Conhal - Arneiro - Renda

Trilho da mina de ouro do Conhal - Arneiro - rende

O Trilho da Mina de Ouro do Conhal é, por todas estas razões e certamente mais algumas, um percurso excelente para passar umas horas em contacto directo com a natureza e ao mesmo tempo ficar a conhecer mais um pouco da riqueza paisagística, histórica e cultural do nosso país, que nunca pára de nos surpreender.

 

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