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Viajar porque sim

Paixão por viagens, escrita e fotografia

Ter | 22.08.17

A ver dinossauros na Lourinhã

 

A Lourinhã está diferente. Já lá não ia há um ror de anos. Quer dizer… não é que eu alguma vez lá tivesse realmente “ido”… Até há uns anos a Lourinhã não era propriamente um sítio onde se fosse, a não ser em trabalho ou visitar alguém. Passava-se lá e até se podia parar para tomar um café, mas não havia realmente graaaaandes motivos ir à Lourinhã…

 

Bom, mas anteontem fui realmente à Lourinhã, e de propósito. A culpa, claro, foi dos dinossauros.

 

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Apesar de situada numa zona que se sabe ser habitada desde o Paleolítico, a Lourinhã só saltou para as primeiras páginas dos jornais quando em 1993 foram encontrados, na praia de Paimogo, os maiores e mais antigos ninhos com embriões de dinossauros conhecidos até então. Mais recentemente, em 2009, encontrou-se na praia do Porto das Barcas um ninho com embriões de Torvossauro – um achado único no mundo, pois até então só tinham sido descobertos embriões de dinossauros herbívoros, e o Torvossauro foi um dinossauro carnívoro. Depois, em 2012 e também em Paimogo, foram encontrados os ovos de crocodilo (fossilizados, evidentemente) mais antigos do mundo: 150 milhões de anos. Tudo isto veio mostrar que a região da Lourinhã é muitíssimo rica em fósseis do Jurássico Superior e tornou-a numa referência da paleontologia mundial.

 

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Já há vários anos que a autarquia local tentava pôr em prática a ideia de um parque dedicado à temática dos dinossauros, mas só agora está a ser possível concretizá-la. Em parceria com a empresa alemã que opera o museu de dinossauros ao ar livre de Münchehagen, na Alemanha, está a ser construído no território do município, mais precisamente perto da aldeia da Abelheira, o Parque dos Dinossauros da Lourinhã, com abertura prevista para 2018. Neste Parque irão ser expostas mais de 120 réplicas de dinossauros, realistas e cientificamente correctas, e haverá um edifício central dotado de um laboratório científico e de um museu – que irá abrigar os achados de dinossauros que estão actualmente expostos no Museu da Lourinhã.

 

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Em jeito de “aperitivo”, estão desde há algum tempo expostos na Lourinhã vários modelos de dinossauros que irão mais tarde povoar o Parque. Descobri-los não é difícil, pois são suficientemente grandes para serem detectados de longe; e é extremamente divertido vê-los coabitarem com alguns dos edifícios mais emblemáticos da vila – como é o caso do enorme T-Rex que nos saúda dentro de uma moldura avermelhada à entrada da Câmara Municipal, ou do Stegosaurus colocado na rotunda em frente à alvíssima Igreja do Convento de Santo António. 

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Neste momento são 19 os bicharocos espalhados pela Lourinhã, cada um deles devidamente identificado com uma placa informativa. O Museu disponibiliza folhetos com o mapa da localização de todos os “bichinhos”.

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Falando do Museu, é mais um local a visitar obrigatoriamente. Além do edifício que abriga os achados paleontológicos (originais uns, outros excelentes réplicas), o Museu tem duas outras vertentes: a arqueológica, que expõe os vestígios da ocupação humana do território desde a pré-história (com particular ênfase para uma engraçada estátua-menir encontrada em 1981 na freguesia do Reguengo Grande); e a etnográfica, com um excelente acervo de objectos e documentos que ilustram profissões antigas, exposto de forma bem organizada e agradável, e a reconstituição de uma casa saloia, entre mais alguns motivos de interesse. Aberto desde 1984, o Museu tem vindo a crescer e a aumentar de popularidade – e de tal maneira que actualmente, como nos confessou uma simpática funcionária, dia em que tenham menos de 300 visitantes é considerado um dia “fraco”. Encontram mais informações úteis no site oficial do Museu da Lourinhã.

 

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A Lourinhã está mesmo diferente: mais simpática, mais alegre, mais divertida. Por causa dos dinossauros, mas não só. Sugiro que vão até lá ver com os vossos próprios olhos. De certeza que não vão dar o vosso tempo por mal empregue.

 

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Qua | 16.08.17

Pateira de Fermentelos, a lagoa tranquila

 

A maior lagoa natural da Península Ibérica está no nosso país.

Fica perto de Águeda e oferece-nos quilómetros de beleza paisagística e actividades de lazer.

O seu nome?

Pateira de Fermentelos.

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Está localizada perto da confluência dos rios Cértima e Águeda e quando completamente cheia ocupa mais de 5 km2 de área. Calcula-se que a sua formação tenha começado ainda na Idade Média. Actualmente é alimentada sobretudo pelo Cértima, mas também por várias outras ribeiras e por águas subterrâneas.

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A primeira palavra que me ocorreu quando parámos numa das várias zonas de lazer existentes no perímetro da lagoa foi “quietude”. O sol já descia no céu por trás de um cobertor cinza de nuvens, apesar do calor, cobrindo com uma luz difusa o enorme manto de água da lagoa, apenas ligeiramente enrugado pelo vento. Quase não se ouvia um som, tudo parecia estar posto em sossego Uma beleza!

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No acesso à Pateira que fica perto da aldeia de Espinhel há uma extensa área arborizada que termina num parque de estacionamento junto a um relvado com parque de merendas. É um dos locais onde a lagoa se apresenta mais deslumbrante. Dois pontões paralelos de terra batida entram algumas dezenas de metros pela água terminando em dois mirantes de madeira gémeos, erguidos sobre estacas. Daqui é possível observar a Pateira na sua maior extensão, de leste para oeste – o lugar ideal para apreciar o pôr-do-sol.

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Em 2013, a Pateira foi classificada como Zona Húmida de Importância Internacional pelo Comissariado Internacional da Convenção de Ramsar. Abriga espécies, habitats e ecossistemas protegidos a nível nacional e internacional, com uma forte componente ornitológica – como de resto é possível perceber pelo seu próprio nome. Além dos (óbvios) patos consegui ainda ver uma galinha d’água, mas por ali também costumam andar cegonhas, garças, maçaricos, guarda-rios e milhafres, entre outros. O coaxar das rãs é, de resto, impossível de ignorar. E a lagoa é fértil em espécies piscícolas e lagostins.

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Esta riqueza biológica, que se estende à flora indígena, é no entanto frágil – como aliás sucede actualmente em todos os ecossistemas. Nos anos 90 a Pateira começou a ser invadida pelo jacinto-de-água, que chegou a ocupar metade da sua área. Apesar de visualmente atraente, esta espécie originária da bacia do Amazonas é uma verdadeira praga dos sistemas aquáticos de água doce e já se espalhou por todos os continentes. Em 2006 começou a ser utilizada uma ceifeira aquática (a que os miúdos da região deram entretanto o nome de “Pato Bravo”) para retirar da lagoa a maior parte da enorme massa de jacintos-de-água. Hoje em dia este problema parece estar relativamente controlado, embora junto às margens ainda existam consideráveis extensões de água completamente cobertas por esta planta.

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Igualmente bonita é a zona de lazer de Óis da Ribeira, um pouco mais a nordeste no perímetro da lagoa, com o seu miradouro e alguns barcos de madeira ancorados na margem. Aqui também existem estruturas de apoio para quem visita o local. Em frente, do outro lado, o edifício branco e negro da Estalagem da Pateira não passa despercebido.

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E para quem gosta (como eu!) de andar a pé, existem dois trilhos pedestres circulares que permitem conhecer mais intimamente o perímetro da lagoa: um mais curto, o Trilho dos Poços (vejam mais informações aqui) e um outro mais longo, que se estende durante alguns quilómetros junto à lagoa e depois acompanha parte da margem sul do rio Águeda (o desdobrável deste percurso está aqui).

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Para saberem mais sobre a Pateira de Fermentelos, visitem o site oficial da Câmara Municipal de Águeda e vejam estes dois pequenos vídeos:

A seguir – claro! – têm de ir conhecer este lugar imperdível. E depois digam-me se gostaram.

 

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Qua | 09.08.17

Quatro anos (com prendas!)

 

Viajar.

Sair do lugar em que vivemos habitualmente. Quebrar a rotina do dia-a-dia. Conhecer lugares novos. Revisitar aqueles de que gostamos. Voltar aos que nos ficaram no coração.

Viajar é a minha maior paixão, que partilho convosco no meu blogue desde há precisamente quatro anos.

 

E para festejar este 4º aniversário do Viajar. Porque sim. e agradecer a todos vocês que me lêem – porque são quem me motiva a continuar a escrever e partilhar as minhas experiências – decidi fazer um pequeno ebook com fotografias (exclusivamente minhas) de alguns dos lugares que mais gostei de visitar até hoje em Portugal. Só alguns, claro, porque há centenas! Uns são bem conhecidos, outros nem tanto, mas todos merecem uma visita e um olhar mais demorado.

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Para receberem este ebook (em pdf) basta que me enviem um email ou uma mensagem pela página do blogue no Facebook com o vosso nome e endereço de email. Mais nada. Fácil, fácil…

 

E ainda há mais uma prendinha. Se costumam utilizar o Booking para reservar o alojamento quando viajam, terão um reembolso de 15€ se fizerem a vossa próxima reserva através do link que está aqui em baixo. Se não costumam usar o Booking… pois esta parece-me uma boa altura para experimentarem. Mas atenção, este link só é válido para um número limitado de reservas (mais precisamente oito, neste momento), por isso talvez seja bom despacharem-se…

 

https://www.booking.com/s/ana72359

 

Espero que gostem do que preparei para este aniversário do blogue. Obrigada mais uma vez a todos os que me acompanham desde o início e me seguem, a todos os que comentam, encorajam e acarinham, aos novos leitores que têm vindo a chegar todos os dias. Estou aqui sempre que precisarem.

 

Boas viagens!

 

*****

 

Four years (with gifts!)

 

Travelling.

 

Going away from the place where we usually live. Breaking the routine of everyday life. Seeing new places. Revisiting the sites we love. Going back to those which remained in our hearts.

 

Travelling is my greatest passion, which I’ve been sharing with you on my blog for four years now.

 

To celebrate this 4th anniversary of Viajar. Porque sim. and thank all of you who read me - because you are my motivation to carry on writing and sharing my travel experiences - I decided to create a small ebook with photographs (taken exclusively by me) of some of my favourite places in Portugal. Only a few of them, of course, because there are hundreds! Some are well known, others not so, but all of them are well worth a visit and an attentive look.

 

To receive this ebook (in pdf format) just send me an email or a message through the blog’s Facebook page with your name and email address. That’s all. Very easy, right?

 

I also have another small gift. If you use Booking.com to book accommodation when you travel, you’ll receive a refund of €15 if you make your next reservation through the link below. If you do not use Booking.com ... well, this seems the right time to start. But pay attention, this link is only valid for a limited number of reservations (precisely eight at this time), so hurry ...

 

https://www.booking.com/s/ana72359

 

I hope you enjoy what I’ve prepared for the anniversary of my blog. I would like to thank once again all of you who have been following me since the beginning, all of you who leave your comments on the blog posts, all of you who encourage me and show me your support, and also the new readers who have been arriving every day. I'm here whenever you need me.

 

Enjoy your travels!

 

 

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21 special places in Portugal

 

 

 

 

Ter | 01.08.17

Ser mulher e viajar

 

Sou contra qualquer tipo de discriminação avulsa. Não admito que uma pessoa seja liminarmente discriminada apenas pela sua cor da pele, religião, sexo, idade, orientação sexual, clube desportivo, nacionalidade ou qualquer outra coisa. Admito que podem existir situações em que seja necessária uma diferenciação no tratamento, mas isso terá a ver com a condição ou características específicas de uma pessoa específica, não com o facto de ser simplesmente mulher ou homem, jovem ou idosa, aborígene ou berbere.

 

Dito isto, sou obviamente contra a discriminação sexual, venha de onde vier. Sim, homens e mulheres são diferentes – fisicamente e cerebralmente – e isso traz algumas implicações a nível prático. Mas não podemos (nem devemos!) tomar o todo pela parte, e vice-versa. Infelizmente, nem toda a gente pensa assim, e se tenho a sorte de viver num país onde existe igualdade de géneros – pelo menos à luz da lei, que se falarmos da sociedade portuguesa de um modo geral e em termos práticos, fácil será constatar que a realidade é algo diferente – há muitos outros países onde a desigualdade impera e (pior ainda!) é ostentada como bandeira.

 

Ser mulher e viajar para esses países, e sobretudo para aqueles onde de facto as mulheres são cidadãs quase sem direitos próprios, seja por questões tradicionalistas ou religiosas, pressupõe uma aceitação tácita de certos usos e costumes – aliás, quando viajamos para onde quer que seja temos de nos submeter às leis desses países, e de preferência também às suas regras sociais, pelo menos na sua parte mais importante e “sensível”. Ser estrangeiro num país não significa automaticamente que podemos agir exactamente como se estivéssemos no nosso, mesmo que na maioria dos países os “turistas” sejam olhados com uma certa benevolência.

 

Então como é que fazemos a ponte entre os nossos princípios e as normas de certos países que vão contra esses princípios? Como é que podemos defender um qualquer direito e depois ir visitar (por gosto, não por obrigação, claro) um país onde esse mesmo direito é vergonhosamente ignorado ou espezinhado? Como é que podemos ir gastar o nosso dinheiro e contribuir, mesmo que seja com uma insignificância em termos monetários globais, para uma hipotética prosperidade desse país?

 

Creio eu que não há uma solução fácil: ou vamos e fechamos os olhos e “aceitamos”, ou simplesmente não vamos – mesmo que seja um paraíso que sempre quisemos visitar. Já estou a ouvir muitas vozes acusatórias a levantarem-se, dizendo que o povo de um país não tem na maioria das vezes culpa do que os seus dirigentes decretam, que grande parte dessas pessoas são vítimas e precisam de que o seu país se desenvolva para que as mentalidades também evoluam, etc., etc. E têm toda a razão. Mas nem todos os países onde essas injustiças e discriminações estão instaladas e até consagradas na lei são pouco desenvolvidos ou pobres, e vários deles são até bem mais ricos do que o nosso.

 

E o que é que me leva a falar disto hoje? Muito simplesmente uma certa tristeza e vontade de desabafar – por sentir cada vez mais que a humanidade e a civilização parecem ter entrado numa espiral descendente e não vejo grandes indícios de que as coisas sejam invertidas a curto prazo. Ouço uma notícia boa, e logo a seguir leio noutro lado uma que é péssima…

 

Sucedeu há dias algo que foi visto como um enorme passo em frente na conquista dos direitos das mulheres no mundo árabe: o parlamento da Tunísia aprovou uma lei que tem como finalidade acabar com a violência contra as mulheres. É um acontecimento histórico num país muçulmano (mas em que o sistema legal não segue a xaria, embora dela tenha extraído algumas leis) que se espera abra caminho para outras decisões igualmente importantes noutros países muçulmanos (podem ler mais pormenores aqui). Fiquei contente. Já estive na Tunísia duas vezes e gosto do país e das pessoas. Gosto sobretudo do facto de ser um país fundamentalmente moderado e pacífico. Depois da Primavera Árabe passaram (e ainda estão a passar) por um período complicado, sobretudo economicamente, mas parecem estar a fazer a transição da ditadura (que existia antes) para a democracia de uma forma relativamente equilibrada, apesar dos problemas económicos que têm enfrentado. Têm ainda muito que “andar” no que toca aos direitos humanos, mas parecem estar no bom caminho.

 

Hoje, o contraponto. No seu blogue, o Leonardo fala de uma viagem recente que fez a Istambul. E refere, ao falar da visita à Mesquita Azul, os preceitos do vestuário que homens e mulheres (mesmo que sejam turistas) têm de seguir para poderem entrar: pés descalços para toda a gente, pernas (preferencialmente) cobertas para os homens, e para as mulheres nada de ombros à mostra, pernas também tapadas pelo menos até ao joelho, e cabeças cobertas (podem ler tudo no site oficial). 

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Sucede que também já estive duas vezes na Turquia, a primeira delas há quase 20 anos. Visitei, naturalmente, a Mesquita Azul (e não só a Azul). Estava bastante calor em ambas as vezes. Da primeira levava um vestido até para o comprido, mas que mostrava um ou dois centímetros dos ombros. Foi o bastante para me atirarem para cima um pano turquesa com a consistência da serapilheira, que cheirava a pó e me fazia comichão por todos os lados, e fui obrigada a suportá-lo durante a visita – que foi miraculosamente breve. Por essa e outras razões, não adorei a Mesquita, mas da cidade de Istambul fiquei desde essa altura completamente fã, e continua a ser a minha cidade europeia favorita. Quando lá voltei já ia prevenida, e apesar de por coincidência nesse dia estar mais uma vez a usar uma t-shirt sem mangas, levei comigo um pareo fininho que pus por cima dos ombros para entrar. Gostei muito mais desta minha segunda visita à Mesquita Azul e demorei-me por lá bastante tempo a apreciar a tranquilidade (nesse dia) do ambiente.

 

Mas em nenhuma das vezes fui obrigada a entrar de cabeça tapada. Nem eu, nem ninguém. Havia mulheres com lenços na cabeça, sim, mas seriam certamente muçulmanas, tal como tantas que vi nas ruas – e para minha surpresa, muito menos do que estava à espera; achei Istambul muitíssimo “ocidental”, excepção feita à linha do horizonte onde se destacam os inúmeros minaretes. Na segunda visita notei na cidade um maior número de mulheres vestidas de forma conservadora – sapatos fechados, guarda-pós por cima da roupa, e lenços na cabeça – mas isso devia-se ao facto de estarem no Ramadão, época em que muitos turcos em todo o país (e há zonas do país que são muitíssimo conservadoras) tiram férias e aproveitam para visitar as cidades “grandes”, como Istambul ou Ancara.

 

Por isso é para mim um desgosto (sem dúvida o termo que descreve melhor o que sinto) saber que agora as mulheres – só as mulheres – são obrigadas a entrar nas mesquitas de Istambul com a cabeça coberta, mesmo fora das horas da oração.

 

Não me interpretem mal. Não tenho nada contra os códigos que regem o vestuário para aceder a lugares religiosos, seja qual for a religião. Em Fátima, na Basílica de São Marcos e em imensos outros locais, católicos e não só, pedem (ou mesmo impõem) decoro no vestuário. Só lá vai quem quer, e não vamos lá para ofender ninguém – embora eu ache que joelhos e ombros à mostra não serão propriamente uma ofensa, mas pronto… Até já fui obrigada no Cairo a visitar uma mesquita (que eu por mim dispensaria e detestei visitar) com uma jelaba horrorosa enfiada por cima da cabeça (horrorosa por ser quente, quando a temperatura do ar ultrapassava os 40°C) porque não podia entrar de cabeça descoberta. Se fosse agora, muito provavelmente limitar-me-ia a ficar cá fora à espera…

 

O que me entristece e revolta é, por um lado, o facto de não fazerem exactamente as mesmas imposições aos homens, e por outro a “regressão” de pendor fundamentalista que está a alastrar em certos países, alguns deles até bastante evoluídos cultural e socialmente. Basta olhar para o que sucedeu no Irão. Hoje, quase 40 anos depois da Revolução Islâmica, é um país que continua socialmente anos-luz atrás do que era antes. Pode haver mais democracia (e será que há mesmo?), mas a igualdade desaparece quando comparamos os direitos dos homens com os das mulheres.

 

Há algum tempo uma amiga convidou-me a ir com ela passar férias ao Dubai. A minha resposta foi só uma: “Nem pensar!”. Admirou-se. Tive de lhe explicar que (além de achar o Dubai um território desprovido de interesse) não quero passar férias em países onde as mulheres são, à luz da lei, cidadãs de segunda. Sim, é verdade que na maioria dos países as mulheres são socialmente mais penalizadas pelos homens; que mesmo em muitas sociedades mais “modernas” ainda ganham menos do que os homens, trabalham mais e são olhadas de forma mais preconceituosa – mesmo pelas outras mulheres; que em muitos países são escravizadas, abusadas, mutiladas, assassinadas – só porque a tradição, a ignorância, as mentes tacanhas e o medo assim o ditam. É verdade que se eu levar a minha recusa às últimas instâncias, são muito poucos os países onde poderei passar férias. Mas uma coisa é a sociedade, outra são as leis. Discriminação existe em todo o lado. Deriva da falta de cultura, educação e sensibilidade. Deriva de dogmas, do falso conhecimento, ou até de experiências pessoais traumáticas. Cabe a quem governa acabar com ela, ou pelo menos tentar, através da lei, da sensibilização, da educação, ou até mesmo da punição. Mas quando essa discriminação é fomentada e instituída pelos próprios sistemas governativos, aí o caso muda de figura. É muito mais grave, e é muito mais difícil de inverter. Revolta-me profundamente.

 

E é por isso que entre ter de fechar os olhos e recusar-me a visitar um determinado país, eu escolho a segunda hipótese. É por isso que, com grande pena minha, não penso em ir ao Irão nos tempos mais próximos, enquanto vigorar o regime actual – provavelmente, acabarei por nunca ir; e quando voltar a Istambul (e espero ter a felicidade de lá voltar), provavelmente não irei entrar em nenhuma mesquita. Ser discriminada não é algo que me dê particular prazer. E escusam de alegar que é para meu bem e para me protegerem: posso não ter cromossoma Y, mas isso não faz de mim burra a ponto de acreditar.

 

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